O protagonismo político da igreja evangélica

 


“Pois deem a César o que é de César e a Deus o que é de Deus” 

(Lucas 20.25).

Religião e política nem sempre estiveram juntas. Essa união teve início com a conversão do imperador Constantino, no séc. IV da era cristã, inserindo a igreja – a católica – num protagonismo político cujos desdobramentos ainda hoje são questionados por alguns segmentos da sociedade em geral.

Atualmente, no contexto brasileiro, a igreja evangélica tem assumido, por meio de suas lideranças mais notáveis e midiáticas, um protagonismo político jamais visto na sua história recente. O pretexto para esse protagonismo político, segundo algumas lideranças evangélicas, é o de que a igreja deve assumir o poder, preparando-se contra possíveis ameaças e perseguições, as quais já fizeram parte de seu passado recente.

Essa busca pelo poder, então, tem início quando a igreja, por meio de suas lideranças, incentiva seus membros a se candidatarem a um cargo político ou a apoiarem determinado candidato. Assim, se o candidato apoiado pela igreja ganhar as eleições, ela passa a reinar, contribuindo para a expansão do reino de Deus aqui na terra e possibilitando que o Senhor reine também. No entanto, fica no ar a pergunta: até que ponto esse protagonismo político da igreja evangélica é benéfico para ela? Neste post, apresento três motivos por que sou contra esse protagonismo, trazendo uma reflexão que expressa minha fé na Palavra de Deus.

1. Segundo a Constituição, o Estado brasileiro é laico[1]. Sendo assim, o protagonismo político da igreja evangélica, estando associado ao poder político dominante, poderá contribuir para a anulação desse princípio constitucional, possibilitando que o Estado venha a interferi nos assuntos religiosos da nação, inclusive na liberdade de religião. Essa interferência seria extremamente prejudicial à democracia e à própria igreja, que passaria a conviver com o fantasma da perseguição. Portanto, a laicidade do Estado é o melhor caminho para a igreja trilhar e, com base nele, proclamar as boas novas de salvação para todos, cumprindo a sua missão. Jesus sugeriu aos seus contemporâneos: “Pois deem a César o que é de César e a Deus o que é de Deus” (Lucas 20.25).

2. A missão da igreja é essencialmente espiritual. Nesse contexto, seu protagonismo político pode ofuscar o cumprimento de sua missão, que é, em sua essência, proclamar o evangelho da salvação a toda criatura, conduzindo-as à salvação em Cristo Jesus (Mateus 28.19). Neste contexto, o protagonismo político tão almejado pela igreja evangélica brasileira, ou melhor, por suas lideranças midiáticas mais notórias, vai de encontro aos ensinamentos de Jesus, que disse: “O meu reino não é deste mundo” (João 18.36). Assim, fazer uso de meios políticos com o pretexto de um suposto protagonismo que colocaria em evidência o reino de Deus aqui na terra é pura ignorância da igreja, tendo em vista a natureza de sua missão. Portanto, resta à igreja reconhecer a natureza espiritual da missão que Jesus lhe confiou, sabendo que a implantação do reino de Deus neste mundo está próxima e terá início, não com o protagonismo político da igreja, mas por ocasião do aparecimento de Cristo nas nuvens, tornando evidentes sua glória e majestade (Mateus 24.30).

3. O suposto protagonismo político da igreja não trará nenhum benefício para ela, mas somente para suas lideranças midiáticas mais notórias, que poderão se candidatar - ou indicar um parente próximo para tal - e se eleger a um cargo político, se beneficiando, direta ou indiretamente, do poder. Como sabemos, alguns desses líderes evangélicos midiáticos têm atitudes secretas que não se coadunam com a vida cristã nem com o ser seguidor de Cristo – alguns até foram presos por corrupção e respondem processos na justiça. Sendo assim, os únicos beneficiados, a meu ver, seriam eles, e não a comunidade evangélica como um todo. Esta, em sua maioria, seria apenas uma massa de manobra dentro desse contexto que envolve o entrelaçamento entre religião e política, servindo infantilmente aos interesses escusos desses líderes, acerca dos quais a palavra de Deus nos adverte: “Movidos por avareza, eles explorarão vocês com palavras fictícias” (2 Pedro 2.3). Portanto, a igreja evangélica brasileira precisa estar atenta, não se deixando manipular por esses líderes interesseiros.

Assim como na política tudo é contraditório, a igreja evangélica, ao procurar exercer o seu protagonismo político, também se torna contraditória por não entender que sua missão não é política, mas espiritual, e consiste em defender as causas e os valores de um reino que não é deste mundo (João 18.36). Portanto, qualquer outra missão que ela assuma ou qualquer outro meio que ela use para anunciar a Cristo, além daquele que a Bíblia impõe, não é legítimo, nem agradável a Deus, seja de direita, de centro ou de esquerda. A Bíblia ainda fala!



[1] Ou seja, o Estado não impõe uma religião aos seus cidadãos, mas permite que eles escolham a sua própria religião.

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